A Vida Exige Pausas

O choro é o ápice de um estouro, de um rompante de euforia, de uma libertação. Quando choramos, condensamos a nossa emoção que passa a escorrer em forma líquida aos montes pelo rosto às quais chamamos lágrimas; e por falar em comoção, a vida se reflete em cada uma delas, naquelas pequenas gotículas que saltam da ponta do queixo fazendo dele trampolim para pingarem em queda livre no peito desnudo de tecidos; um motivo, uma lembrança ou uma saudade que não se explica jaz escondida na transparência de cada gota. Os olhos são as comportas da alma, que por sua vez é uma represa de sentimentos prestes a se romper sem aviso prévio ou sinais de rachaduras aparentes. Viver é um perde ganha, e no que compete aos propósitos, em nada soma o fato de colocá-los acima do valor que a vida possui, ou seja, minha vivência em prol de um propósito não deve ser maior que meu propósito de vida. Nos dias de densa tempestade, nos momentos em que sopra um vento frio como se houvessem ali momentos particulares de inverno, em frente ao espelho não é o melhor lugar para se buscar abrigo, basta considerar o fato de que a imagem que deveria ser motivo de orgulho, de profunda admiração por aquilo que se é e se tornou em comparação com o que se foi há alguns anos atrás, não passará de uma figura melancólica, inapta a sorrir, tomada pelo baixo astral; em momentos assim, o espelho não é o seu melhor amigo, pois tendemos a nos depredar ainda mais quando a tristeza nos habita. Não adianta se rebelar, a vida é uma variante instável, e nem sempre o mar está pra peixe, mas isso não deve ser motivo de vergonha, afinal, quem nunca pensou em desistir que faça ressoar bem alto a primeira gargalhada.

Sou um tanto quanto ignorante quanto aos fatos que me cercam e sei muito bem do que estou falando, já que em ocasiões passadas agi da mesma forma que pretendi agir agora e foi bem assim se sucederam as decepções, o que mais incomoda é que se torna cada vez mais difícil abrir o coração para novas aventuras, e a plenos pulmões expirar e inspirar novos ares, e em novos ambientes expandir o campo de visão afim de captar todos os detalhes dos mais discretos até os mais notáveis, em cada canto, em cada ladrilho imaculado que reflete os rostos cobertos de maquiagem, uma falsa camada cutânea que esconde os reais temores de um coração humano que foi duramente golpeado cujos descontentamentos se expressam através do rosto por intermédio de suas expressões; em suma busco em cada ângulo reto, opaco e frio que jaz esquecido nas extremidades mais desprovidas de luz, as mesmas que comportam as energias negativas de cada lágrima que ali se derramou no desespero ininterrupto pela busca de uma guarida na qual se pudesse recostar; em cada viga do teto que sobre aquelas pobres cabeças teve plena visão de cada um que ignorou tais divisas e se esgueirou pelos vãos e portas, cômodos e varandas afim de ter um pouco de privacidade para renovar suas alianças com pensamentos que lhe afligiam naquele instante. A vida nem sempre é fácil de se tocar adiante, tem dores que imolam nossa alma de modo que a ferida não sutura e dia após dia é renovada a golpes de navalha por olhares afiados e línguas cortantes; viver exige uma certa força da qual num primeiro momento desconhecemos.

 Alarmes falsos não são improváveis ou impossíveis de ocorrer, todavia quando tudo passa a aborrecer algo está errado, e certamente pode ser que seja conosco, que por estarmos aéreos demais no campo das idealizações passamos a fantasiar e a criar roteiros, a dirigir cenas das quais gostaríamos de vivenciar, ou que se pudéssemos faríamos com que se concretizassem e que contudo, na verdade servem apenas como meras distrações que nos cegam e distraem frente ao que realmente deve ser feito. A realidade não é dura, somos nós que somos moles demais, optando quase sempre pela versão romantizada dos fatos; por fim, o choque de realidade que se sucede nada mais é do que resultante de uma omissão nossa frente aquilo que nos incomodava e que nos negamos a aceitar. “O pior dos cegos é que se nega a enxergar” é como dizem por aí, em consequência disso nem todo estado de tristeza é causado por elementos externas ou pela ação de terceiros. Nos são apresentadas histórias fantasiosas demais na infância, e isso costuma ter um preço bem caro ao longo da vida para aqueles que não se desligam delas a tempo, ainda assim, tudo depende do quão desesperado se é e do quão ansioso se tornou, porque a ociosidade sim é inimiga da naturalidade; sendo eu um ser ridiculamente desesperado, afobado e ansioso, acabo por forçar as situações, forjando o encaixe das coisas na marra, forçando também a barra, e assim a naturalidade é asfixiada, porque quem fabrica o que quer ver deixa de se ater ao que realmente precisa perceber. 

 Algo que costuma funcionar muito bem comigo e que está acessível a todos, é parar um pouco o que se está fazendo e imputar o uso de um recurso precioso que costumamos utilizar de forma errônea: a nossa visão! Uma simples observação ao redor se atendo aos fatos bem como aos detalhes minuciosos da natureza já bastariam para nos acalmarmos um pouco, renovando as forças ocultas que encobertas pela sensação de tristeza deram a falsa impressão de terem se esgotado. A obra de Deus é tão maravilhosa que chega a ser inexplicável para a limitada mente humana, a tamanha variedade e peculiaridade de cada criatura; os traços de cada paisagem; o tom de cada vegetação; as características de cada espécie, são, para aqueles que creem, a obra do supremo arquiteto do universo que dispensa dúvidas de qualquer tipo. O tempo todo a vida se renova e aponta para necessidade de perpetuação de sua existência; a todo instante uma folha se desprende de uma galha deixando para trás uma nova ramificação a se desenvolver; de fato, nenhuma folha cai da árvore sem a permissão de Deus concedida através da natureza, e nenhuma delas o faz sem que antes seja outorgada pelo mesmo uma nova ramificação, um novo membro que dará origem a outras folhas viçosas e verdes. A todo instante vejo a natureza dando sinais de que a vida não pode parar, pelo contrário, deve continuar; nos frutos suculentos recheados de sementes; nas flores sendo polinizadas pelas abelhas; nos novos brotos de uma suculenta; na migração dos pássaros e travessia dos mares e rios pelos peixes indo em busca do local de reprodução; a natureza a todo instante diz: a vida precisa continuar. Os ventos a todo instante sopram: a vida tem de continuar. A vida a todo instante dá sinais de que ela precisa caminhar adiante, se reinventar. Em momento algum a natureza indica que é a morte que deve ou vai imperar sobre tudo, ou que a dor reinará ou que a escuridão cobrirá a todos por definitivo; prova disso é que findadas as tempestades, logo as nuvens se esvaem cedendo lugar a luz do sol ou do luar; e nenhum eclipse é para sempre e nem mesmo a noite dura 24 horas, porque apesar de existir e ser necessária, a escuridão é apenas uma fase que está inserida no contexto da vida.

 No entanto, a capacidade de observância e de absorção desses mínimos detalhes deixou de ser uma prática cotidiana para se transformar numa tarefa dificílima para muitos, haja vista que na atualidade o que parece ser relevante são os grandes feitos, as grandes acepções, as maiores aquisições são as que sempre se destacam e ganham espaço. Quanto maior, melhor e mais cobiçado, porém, quanto maior o prêmio em igual intensidade deve ser a dedicação. As redes sociais tem culpa nesse cartório, pessoas ostentando sem parar atraem outras pessoas que cobiçam na mesma proporção, o que acontece é que a maioria do que se vê não passam de coisas falsas e ilusórias, fazendo com que quem finge por trás das câmeras esconda o seu vazio, enquanto provoca o vazio em outras pessoas. É a era da ascensão tecnológica, que promoveu através dos meios eletrônicos a inveja e a avareza. Todos estão desesperados por cliques tendo mais do que fulano de tal, que por sua vez quer ter mais do que ambos. Muitos são os que julgam a si mesmos baseados em terceiros, como se a regra de valor fosse medida pela comparação instantânea, sem levar em conta toda bagagem que se trás, além do mais, sequer sabemos como e com quais artifícios estes chegaram onde chegaram. Não importa como caminhem os rumos de sua história, esqueça os outros. O que eu faço é ético? O que faço é relevante? Chegar onde cheguei, da forma que cheguei vale realmente a pena? Sempre devemos nos fazer tais questionamentos para nos mantermos “na linha”. Talvez, as respostas a estas perguntas seja sim para alguns, talvez, seja não para outros, independente disso, o importante mesmo é perceber o quanto antes que a vida só tem sentido se tiver verdade nos propósitos, amor verdadeiro nas relações e fidelidade nos laços estabelecidos, coisas que as redes sociais não mostram e que tampouco são capazes de agregar. Nunca se julgue baseado na vida dos outros, porque as mídias sociais não são um modelo de vida, e sim são um palco onde todos os atos tem um final feliz. Enfim, o  que é julgar? Neste sentido seria se auto avaliar como forma de identificar as falhas reincidentes, ou seja, aquilo que pode ser mudado, fazendo isso todos os dias após repousar sua cabeça no travesseiro, é bem certo que encontrará com êxito atualizações constantes que lhe permitirão alcançar a posteriori melhores versões de si. Não obstante, é mais reincidente de se testemunhar pessoas julgando umas às outras, pois parece ser mais fácil apontar o dedo e fazer duras críticas e fervorosos julgamentos às outras pessoas, deixando se tornar amargo e repulsivo, jogando no lixo a oportunidade de se tornar alguém melhor; julgar neste caso seria se ausentar das responsabilidades morais se colocando numa posição superior, omitindo o fato de que você é tão falho quanto aquele que você julga. 

 Vida. Medos. Observações. Julgamentos… são muitas as encruzilhadas em que tais pontos se cruzam gerando outros inúmeros questionamentos e leques de possibilidades. Ainda assim, apenas um elemento poderá nos unir, ou na menor das hipóteses, permitir que nos aceitemos e reinventados pela aceitação, buscar sermos pessoas melhores do que ontem, do que anteontem, do que há alguns segundos atrás. Afinal, tudo mais perde o sentido quando você tem de se esforçar para encaixar em algum lugar, mas quando se tem alguma forma de amor dentro do peito, as questões mais egoístas a respeito disso passam a não importar mais. Amor não se trata de jogo de azar, e sim de um estado de espírito, uma evolução que poucos estão preparados para vivenciar, junto ao amor não vem um manual de instruções, mas vem responsabilidades, é preciso ser maduro para ser digno não de fazer alguém feliz, mas sim de somar a sua felicidade à dela alcançando assim a satisfação de estar onde está com quem está. Amar não é nenhum crime; crime é ter medo de amar por receio do que vai lhe acontecer, já que para amar é preciso estar disposto a tudo, inclusive ao risco de ser rejeitado, mas isso não importa, não é você quem perde ao rejeitar o amor. Amar é deixar se esvair sem se importar com o que ficou para trás, é partir sem voltar para buscar as malas, é tocar um acorde sem ficar para ouvi-lo, é soprar uma fogueira sem ficar para ver a chama se acender, é praticar uma doação sem ficar para ver o sorriso de gratidão surgir no rosto de quem o recebeu. Porém, o ego impede que qualquer um seja tão transparente a ponto de não esconder segundas intenções por dentro de si onde os olhos são incapazes de penetrar. Ame incondicionalmente a Deus e a si mesmo, como consequência todo resto lhe será acrescentado.

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