Estes Pés…

Estes meus pés manchados de poeira
Da velha estrada tresloucada da vida,
Calejados e feridos, tem história pra contar
Sem eira nem beira ou sentir fadiga
São meus escudos na labuta diária
E as minhas armas usadas na corrida,
Os mesmos que caminham no jardim florido,
Que mesmo florido não se pode confiar
Carregam marcas profundas na carne
São cicatrizes dos espinhos que pisei por lá.

Repletos de pequenas bolhas latentes
Prestes a estourar sem prévio aviso
Ah meu Deus, como elas doem!
Se eles pudessem dizer, diriam.
Transpirando abafados sem cessar
Umedecendo os densos sapatos
Comprometendo meu caminhar
Escorregando na sola a cada passo,
Desconfio que seja algum protesto
Uma forma louca de desabafo.

São esses cascudos e carcomidos
Cujas unhas devoradas por micose
Trazem em si vestígios de terra molhada
Das lavouras onde se planta o que colhe,
Sambando pelos eitos e carreiras,
No ritmo acelerado da colheita,
Pegadas são deixadas para trás
Moldadas na seca poeira
Registrando uma marca única,
Mais uma pegada no mundo foi feita.

Os mesmos pés que me acompanham na dor
São os que desfrutam do prazer e da glória
Confesso que os limpo a sujeira do trajeto
Banhando-os com minhas lágrimas mornas.
Os dedos maiores como densos escudos
Tropeçaram destroncando numa dor infeliz
Por uma trilha estreita, num íngreme morro
Pedindo socorro, mas com equilíbrio venci.

Esses pés que me levam a lugares bonitos
São os mesmos que doem ao fim da caminhada
Mesmo quando no câmbio ligeiro se apruma
Passando as marchas da moto engatada
Me levam contentes até meu amor,
Num trajeto oculto que não deixa pegadas.
A felicidade possui uma regra:
mantida em segredo não poderá ser violada.