Passado é uma página encardida que foi virada e diferente da dos livros, não pode (e não deve) ser aberta e lida novamente, entretanto para muitos virar realmente a página revela-se um verdadeiro desafio, uma tarefa árdua e por vezes dolorida, confesso que me encaixo com maior frequência e me identifico melhor com este grupo de pessoas. Parece que somos egoístas demais (ou pelo menos o bastante) para nos apegarmos fielmente às coisas ou pessoas e sentimos tamanha dificuldade em aceitar as partidas, pois não nos adaptamos bem às despedidas, e infelizmente o tempo se despede de nós a todo instante. Se Deus nos prometesse que viveríamos mil anos, certamente a primeira coisa que diríamos a ele seria: só isso? Percebeu o egoísmo enraizado dentro de nós, quase que automático e imperceptível? Não estamos satisfeitos com a quantidade e, por isso, não poucas vezes acabamos nos descuidando também da qualidade com que fazemos e vivemos as coisas, e isso é um fato preocupante. Por outro lado, se você é uma pessoa mais cética, ou não muito religiosa, pensemos nessa situação de uma outra forma; imaginemos que você ganhe um sorteio qualquer, que lhe dá o privilégio de passar um dia inteiro com seu maior ídolo, talvez não seja de imediato, mas com certeza você achará que vinte e quatro horas serão muito poucas para viver aquele momento tão sonhado e esperado, levando em conta a enorme admiração que você tem por aquele artista em questão, logo fica explícita a tremenda dificuldade que temos em saber aproveitar e com grande gosto um instante dentro do seu tempo de duração, seja ele curto ou longo, porque na verdade não é o tempo que faz a diferença, e sim a dedicação, a entrega e a emoção depositada, em outras palavras, é deixar que o tempo siga seu curso natural e aceitar de vez que tudo tem um começo e um fim, e que o nosso comportamento em meio a estes dois pontos é quem define a intensidade da experiência. Além do mais, felicidade é um instante, uma ocasião especifica, um acontecimento, como bem disseram os gregos, então precisamos aprender a acessar estas lembranças felizes nos momentos menos oportunos, para que possamos reviver a felicidade mesmo quando o momento não seja propício para isso.
A satisfação que temos para com as coisas é algo fantástico, fascina o olhar de quem observa, embora não haja um caminho específico para o alcance da felicidade, muito menos uma receita ou instrução pré-fabricada, creio na vida como sendo um grande desafio a nós proposto, uma infinidade de opções e possibilidades. Entretanto, de uma forma mais simples, vejo e sinto a vida como sendo um grande quebra-cabeças no qual os momentos vividos e as emoções experimentadas, sejam elas tristes, sejam felizes são as pequenas pecinhas que o compõem. Atalhos não funcionam de forma devida quando o assunto em questão é a vida, porque geralmente atalhos são tomados a fim de se encurtar um caminho mais longo, em outros termos, atalhos servem para pular etapas, etapas essas que geralmente costumam ser constituídas de ensinamentos, regras e aprendizados importantes e essenciais para o nosso crescimento e amadurecimento pessoal. Entretanto, contornos devem ser constantemente adotados, já que nesse caminho não faltam longos obstáculos e barreiras, e o rio não obedece as montanhas que encontra em seu trajeto, ele as contorna e de alguma forma sempre chega ao mar em dado momento. Há pessoas que se satisfazem de modo errado, fazem uso de entorpecentes em busca de esquecer os problemas que os assolam ao invés de encarar um por um e mostrar quem é que realmente manda e, tendo extrema dificuldades em vencer estas impedimentos, drogam-se tornando o desafio ainda maior, não constroem a “rampa” para o alcance dos momentos felizes, dado que todos os seus momentos são de ilusão, quando não estão em outra dimensão sob efeito destas substâncias químicas, encontram-se extremamente tristes e depressivos após a passagem do efeito das mesmas. Denegrindo a si próprios emocionalmente e fisicamente, mais hora, menos hora, irão se sentir completamente vazios sem que haja mais nenhum resquício de vitalidade e esse enorme vácuo que se apropria de tudo chegará a tal ponto que viver passará não fazer mais sentido para estas pessoas, porque colhemos aquilo que plantamos e, se plantamos ilusões, colheremos tristezas e, no campo sentimental, pode ser tarde demais para poder desmatar a densa e escura floresta que se formou e reflorestar o ambiente com boas sementes. Os traumas psicológicos se fortalecem com o tempo e os medos ganham força, tamanho e notoriedade caso não sejam encarados de frente e com determinação. A psicologia é fantástica quando nos diz que dois momentos distintos podem ter significados diferentes e gerar emoções antagônicas. A depender da situação, da condição e do momento, algo que lhe amedronta pode também lhe causar alegria, prazer e admiração e vice-versa. Sendo assim, é imprescindível que peguemos aquelas bagagens que pesam na nossa caminhada e tentemos de algum modo transformá-las em algo útil, retirando de dentro delas as peças de roupa que ainda nos servem, o perfume lá dentro esquecido (mas não as maquiagens e disfarces, estes deixemos como estão), a fim de aprendermos a conviver com aquilo que é impossível mudar, mas que pode sair de evidência e passar a ser apenas mero detalhe, sem potencial para tirar nosso foco principal. É possível reverter a situação, mas é preciso se levantar e dar o primeiro passo enquanto ainda há tempo e oportunidades para isso, devemos deixar e medo de lado e sermos mais fortes que ele.
Por falar em medo, essa sensação tão nobre natural do ser humano e também dos animais irracionais, convém ressaltar inclusive que possuímos privilégios em comparação aos animais, pois podemos identificar de onde ele vem e assim decidir o que fazer com ele, e finalmente vencê-lo. O medo em sua forma natural é essencial, serve para nos proteger, servindo como mediador entre as nossas decisões dentre aquilo que podemos ou não fazer, pessoas destemidas sem medo algum são desenfreadas e se machucam muito, seja em seu corpo físico ou no seu campo emocional, que é muito mais suscetível a reagir de modo negativo às feridas e demora mais para se curar delas. Existem várias formas de medo: o recuo, o silêncio, a submissão… cabe a nós identificar qual deles é o nosso caso e como ele nos impede de progredir, pode ser que alguém esteja fazendo uso desse recurso para nos manipular de alguma forma, todavia controle através do medo tem curta duração, porque, onde o respeito não governa, a relação não se perpetua. Ademais, há momentos em que esse medo se concentra dentro de nós numa dose mais elevada do que o desejado e, quando o mecanismo interno está desregulado, podemos experimentar pavorosas experiências regadas a muitas palpitações e falta de ar. Uma crise de pânico é a pior experiência que alguém pode vivenciar, porque revela um estado emocional completamente disforme e desequilibrado, marcado por traumas e memórias que não são muito agradáveis de se relembrar.
Parece loucura acreditar que a vida não faz sentido algum, dado que em certos momentos nossas expectativas se esvaziam e nada há para preencher esse vácuo que resta. Assim, passamos a interrogar incansavelmente a existência e tudo que a envolve, não são todos, mas a grande maioria acaba por fazer questionamentos que nem mesmo a ciência pode dar respostas. Tudo nesta vida tem um sentido específico e um significado para nós que vivenciamos determinadas situações e momentos, é mais que preciso estar preparado para contratempos, embora não estejamos na maior parte das vezes, ainda assim, manter o pé atrás com determinadas circunstâncias é preciso para nosso próprio bem-estar, é impossível passar pela vida sem aprender lições das quais não esqueceremos jamais. Por exemplo, a curva do sifão da pia possui uma serventia: acumular um pequeno volume de água e impedir que os odores do esgoto retornem para dentro de casa. Parece esdrúxulo não é mesmo? Entretanto, não é, e essa informação é mais profunda do que parece, dado que revela para nós a importância das curvas em nossas vidas. Quantas vezes reclamamos das curvas da estrada? Entretanto, elas têm um propósito enorme, assim como tudo tem o seu propósito. Numa estrada sem curvas, o perigo de se acidentar é maior, sendo que todos vão acelerar sem limites pensando estarem seguros pela ausência de obstáculos, quando na verdade são eles que nos mostram quando é o momento de pisar nos freios.
Quando nós buscamos o fundamental da vida, ignorando as propagandas exacerbadas da mídia e os programas sensacionalistas da TV que nos vendem ilusões a todo instante, passamos a viver melhor. Entretanto, o que acontece é que somos facilmente seduzidos e nos tornamos obcecados por buscar e prezar a todo momento pelo essencial, que são os meios para se alcançar o fundamental. Encontramos a felicidade a partir do momento que valorizamos os pequenos instantes da vida como dito inicialmente, porque são eles que nos pertencem. Para que se viva bem e sem culpas, é necessário que se tome um série de medidas e se desenvolva hábitos saudáveis de convivência, mas é fundamentalmente preciso que se saiba guardar bem duas coisas: segredos e desabafos. Desabafos são a forma mais justa e desesperadora que a alma encontra para se libertar da opressão, e é lindo quando ela consegue expurgar todo mal que a assola. Desabafos são como segredos, e não são todos que sabem guardá-los e recebê-los da forma devida. Porém, nem todo segredo deve ser revelado, sendo que nem todos são nossos, alguns confidenciamos para alguém que depositou em nós toda a sua confiança. Todos somos como cofres ambulantes que guardam algum segredo de alguém que os considerou pesados demais para os carregarem sozinhos. Segredos são densos, desabafos são maçantes, não é todo mundo que consegue expulsar toda carga através de lágrimas, é muito difícil conviver com a culpa de estar confinado junto a você mesmo sem ter coragem para sair por medo do que há lá fora. Sim, compreendo que cada um digere suas dores de um modo diferente, isso que as torna únicas como são. Entretanto, nem tudo depende exclusivamente de nós ou podemos levar sozinhos adiante, é pesado demais o fardo da vida para que se carregue sozinho o tempo todo, dar as mãos é necessário para conseguir vencer a travessia. A confiança é uma ponte que liga as relações humanas, e é bem verdade que muitas delas estão quebradas e ainda mais verdade que as pessoas não aprenderam a saltar de paraquedas, somos interdependentes, alguns totalmente, e não são todos que julgamos ser diferentes por prometerem permanecer conosco até o fim que de fato cumprem com a sua palavra. A diferença pode se garantir nas palavras, mas se perpetua nas ações, de nada adianta falar de uma forma e agir de outra completamente disforme. Muitas palavras e pessoas vão nos machucar, precisamos entender que a vida pode ser comparada a um jardim, e somos todos como flores, as mais bonitas são daquelas galhas mais podadas, pode parecer contraditório, mas são os processos mais dolorosos que, por vezes, dão origem às histórias de maior sucesso.
Seu texto é muito bom mesmo, parabéns
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Perfeito gostei muito, parabéns
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Obrigado pelo carinho, fico feliz pela sua visita. 😉
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Lindo texto
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Obrigado pelo carinho, fico muito feliz que tenha gostado. Forte abraço. ❤
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Perfeito, parabéns. Abraço.
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Maravilhoso texto.
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Obrigado professor, forte abraço.
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Maravilha seu texto como sempre, prende a atenção do leitor.
Parabéns!
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Obrigado.
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